25 de setembro de 2009

'Amália' desfia um folhetinesco rosário de penas

Resenha de filme
Título: Amália
Direção: Carlos Coelho
da Silva
Elenco: Sandra Barata
Belo, Carla Chambel,
Ricardo Carriço e
Ricardo Pereira, entre
outros atores
Cotação: * * * 1/2
Em cartaz no Festival
do Rio (Sessões entre
26 e 28 de setembro de
2009)

"É a vida que carrega as tristezas. Não sou eu...", diz Amália Rodrigues (1920 - 1999) a uma certa altura da vida para Ricardo Espírito Santo, o homem que resolve amar tarde mais. A cena está em Amália, o controvertido filme de Carlos Coelho da Silva sobre a trajetória da maior cantora portuguesa. Voz máxima do fado, Amália desfiou um rosário de penas - como explicitou na letra de Foi Deus - ao cantar um repertório que atravessou as fronteiras lusitanas porque Amália colocava a alma na voz. O filme de Coelho - ora em cartaz no Brasil em cinco sessões agendadas dentro da programação da edição de 2009 do Festival do Rio - rebobina esse rosário de penas em tom folhetinesco, com jeito mais de televisão do que de cinema propriamente dito. Contudo, funciona e sustenta o interesse do espectador ao longo dos 127 minutos de sua projeção porque a vida de Amália daria mesmo um filme. Ou uma minissérie. Moça pobre, amargou jovem a perda de uma das irmãs (Aninhas, vivida por Beatriz Costa) e teve que se casar forçada com um guitarrista aventureiro, Francisco da Cruz (José Fidalgo), enquanto se transformava aos poucos na maior voz do fado. Com sua narrativa iniciada em Nova York (EUA), em 1984, ano em que Amália considera a possibilidade do suicídio por conta do diagnóstico de um tumor do cérebro, o filme se desenvolve num grande flashback. Apesar de um certo vaivém no tempo, os acontecimentos que marcaram a vida de Amália são narrados de forma quase cronológica. Não há dúvidas de que Amália, o filme, foi produzido (com luxo) para atrair grandes e conservadoras platéias. Mas o faz com certa dignidade. Em parte porque a história em si é boa e plena de reviravoltas à moda de um folhetim. Em parte porque a atriz escolhida para encarnar Amália Rodrigues na tela, Sandra Barata Belo, tenha atuação convincente sem atingir o caráter mediúnico de uma interpretação como a de Marion Cotillard em Piaf - para citar somente o exemplo recente de um filme que parece ter inspirado a produção de Amália. A diva do fado é retratada com doses altas de generosidade, como se a intérprete fosse a heroína de uma novela. O que de certa forma ela é nesse filme folhetinesco que, aliás, inclui no elenco um ator português popularizado em novelas brasileiras, Ricardo Pereira, que faz bem o papel de galã ao encarnar o playboy Eduardo Pitta Ricciardi, umas das paixões de Amália. Enfim, para quem não se importa de ir ao cinema para assistir a um filme de tom novelesco, Amália oferece satisfação garantida. Sobretudo quando se ouve na tela grande a voz imortal da igualmente grande dama do fado. A intérprete que carregou para sua música todas as tristezas da vida.

6 Comments:

Blogger Mauro Ferreira said...

"É a vida que carrega as tristezas. Não sou eu...", diz Amália Rodrigues (1920 - 1999) a uma certa altura da vida para Ricardo Espírito Santo, o homem que resolve amar tarde mais. A cena está em Amália, o controvertido filme de Carlos Coelho da Silva sobre a trajetória da maior cantora portuguesa. Voz máxima do fado, Amália desfiou um rosário de penas - como explicitou na letra de Foi Deus - ao cantar um repertório que atravessou as fronteiras lusitanas porque Amália colocava a alma na voz. O filme de Coelho - ora em cartaz no Brasil em cinco sessões agendadas dentro da programação da edição de 2009 do Festival do Rio - rebobina esse rosário de penas em tom folhetinesco, com jeito mais de televisão do que de cinema propriamente dito. Contudo, funciona e sustenta o interesse do espectador ao longo dos 127 minutos de sua projeção porque a vida de Amália daria mesmo um filme. Ou uma minissérie. Moça pobre, amargou jovem a perda de uma das irmãs (Aninhas, vivida por Beatriz Costa) e teve que se casar forçada com um guitarrista aventureiro, Francisco da Cruz (José Fidalgo), enquanto se transformava aos poucos na maior voz do fado. Com sua narrativa iniciada em Nova York (EUA), em 1984, ano em que Amália considera a possibilidade do suicídio por conta do diagnóstico de um tumor do cérebro, o filme se desenvolve num grande flashback. Apesar de um certo vaivém no tempo, os acontecimentos que marcaram a vida de Amália são narrados de forma quase cronológica. Não há dúvidas de que Amália, o filme, foi produzido (com luxo) para atrair grandes e conservadoras platéias. Mas o faz com certa dignidade. Em parte porque a história em si é boa e plena de reviravoltas à moda de um folhetim. Em parte porque a atriz escolhida para encarnar Amália Rodrigues na tela, Sandra Barata Belo, tenha atuação convincente sem atingir o caráter mediúnico de uma interpretação como a de Marion Cotillard em Piaf - para citar somente o exemplo recente de um filme que parece ter inspirado a produção de Amália. A diva do fado é retratada com doses altas de generosidade, como se a intérprete fosse a heroína de uma novela. O que de certa forma ela é nesse filme folhetinesco que, aliás, inclui no elenco um ator português popularizado em novelas brasileiras, Ricardo Pereira, que faz bem o papel de galã ao encarnar o playboy Eduardo Pitta Ricciardi, umas das paixões de Amália. Enfim, para quem não se importa de ir ao cinema para assistir a um filme de tom novelesco, Amália oferece satisfação garantida. Sobretudo quando se ouve na tela grande a voz imortal da igualmente grande dama do fado. A intérprete que carregou para sua música todas as tristezas da vida.

25 de setembro de 2009 às 20:01  
Anonymous Anônimo said...

Olá Mauro,o seu texto de análise crítica é belíssimo. "A intérprete que carregou para sua música todas as tristezas da vida"- me emocionei. Às vésperas dos 10 anos de ausência sentida de Amália( falecida a 6/10/1999)muito oportuno o lançamento do filme que, se não é uma obra-prima, não desmerece a grande Diva da música portuguesa que , conforme voce igualmente noticiou, integra o recente lançamento da gravadora Biscoito Fino ao lado de Vinicius de Moraes, Jose Carlos Ary dos Santos e Natália Corrêa.
Mais uma vez obrigada pela sua sensibilidade atenta as manifestações culturais de além-mar.
Grande abraço
Eulalia Moreno
São Paulo

26 de setembro de 2009 às 01:42  
Anonymous Anônimo said...

É isso aí Mauro!! Amália uma das grandes divas ao lado de Piaf, Holiday, Callas, Ella e Sarah( dentre outras que foram estrelaas aqui e hoje são estrelas no céu). Bem lembrado, dez anos sem Amália.Saudades! Mas Portugal agora tem a Mariza cantando fado como ninguém.
abração, valeu lembrar
Alex Cruz de Malta
Capital-SP

26 de setembro de 2009 às 22:55  
Anonymous Diogo ! said...

O fado é o blues da Europa!

Desconheço a Sandra Barato Belo assim como não conhecia Marion Cotillard, que deu show em " Piaf " . PS: Marion foi a primeira atriz a ganhar um Oscar falando francês.

Sucesso ao longa. E Viva Amália, Piaf, Holiday, Callas, Ella, Sarah, Célia e Elis. Além de Mercedes, Aretha e Cesarea.

28 de setembro de 2009 às 00:34  
Anonymous Amalia said...

Bravo Diogo!
Sua lista só não é perfeita porquê esqueces de Etta James, Marlene Dietrich, Elizeth Cardoso e a outra portuguesa Carmem Miranda. No mais, incluiu grandes cantoras fora do eixo-Europa/USA.Ótimo

Gostei disso.O fado é o blues da Europa!

28 de setembro de 2009 às 12:44  
Blogger Unknown said...

Olá Mauro, parabéns pelo seu blog. É o meu preferido entre todos os que consulto. Sou um português apaixonado pelo Brasil, em particular pela sua música popular, e em particular ainda pelas suas maravilhosas cantoras (venero algumas dezenas!) Mas a Amália é um caso único mesmo. Em pequeno não suportava fado mas adorava a Amália, um pouco como quem não gosta de ópera mas não dispensa a Maria Callas. Continuo a venera r a Amália, mas hoje já gosto de fado e de todas as boas cantoras que têm surgido (Mísia, Mariza, Aldina Duarte, Kátia Guerreiro, Cristina Branco, Mafalda Arnaulth e o grande Camané, um dos poucos homens fadistas conhecidos mas talvez o melhor da nova geração).
Mauro, a sua apreciação do filme Amália é muito justa. Eu gostei, embora seja inferior ao Le Môme sobre a Piaf. Mas é um filme popular, televisivo, mas digno, e isso é muito raro no cinema português. No cinema brasileiro lembro dois belos filmes nessa linha: Cazuza e Filhos de Francisco. Talvez por eu gostar tanto da cultura brasileira, esses dois filmes me emocionaram muito, mais que Le Môme e Amália.
Obrigado pelo seu blog.

28 de setembro de 2009 às 21:30  

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